EDITORIAL

Astronomia: a contribuição do Universo para a libertação humana!

Para além do enorme incentivo que a Astronomia tem dado ao desenvolvimento cientifíco e tecnológico (ver “O Observatório”, vol 10, nº7), existe outra razão fundamental, que torna a Astronomia tão importante: trata-se da sua capacidade de dar prazer!

Sabemos hoje que o cérebro humano desenvolve-se melhor, aprende melhor quando os assuntos que lhe são apresentados são interessantes. Sabemos também que o cérebro humano é sedento de conhecimento (veja-se como as crianças são curiosas, aprendem tudo o que gostam, os seus cérebros são como esponjas). O estabelecimento de sinapses, conexões entre os neurónios, parece ser uma actividade fundamental para a vida e que envolve um mecanismo de auto-recompensa que inclui o prazer: o prazer do conhecimento, o prazer da descoberta.

Ora os temas do Espaço (“the final frontier”), pelo fascínio que encerram, motivam crianças e adultos para a aprendizagem. Basta assistir a uma palestra pública de Astronomia para verificar o brilho nos olhos daqueles que estiveram presentes. Saem dela enriquecidos, os seus cérebros ainda digerindo a informação que receberam sobre assuntos enigmáticos de que sempre quiseram saber um pouco mais. Saem enriquecidos, os seus corações algo reconfortados, algo desconcertados pelo infinito por cima das suas cabeças.

É comum reconhecer que conhecimento é libertador (talvez por isso, as ditaduras nunca foram amigas da divulgação do conhecimento). E a Astronomia certamente que nos ajuda a libertarmo-nos. Por exemplo, ajuda-nos a libertarmo-nos do medo, do medo do destino pré-determinado por estrelas ou cometas. Devolve-nos o poder de intervir nas nossas vidas, deixamos de estar à mercê dos elementos cósmicos ou dos ditadores.

A Astronomia situa-nos no Universo físico, coloca-nos nesta Terra, grão de poeira num universo enorme, onde tudo é possível. Põe em questão as lutas mesquinhas do dia-a-dia, a tentativa de lixar o colega e de ter mais poder que ele, a tentativa de manobrar as pessoas para os seus próprios fins.

Um défice de cultura científica constitui um défice democrático. A cultura científica é, hoje em dia, um direito fundamental. Sem entender a Ciência, o cidadão fica de fora de tantas questões que fazem agora parte da sua vida.

Curiosamente, os políticos começam finalmente a aperceber-se de que dando mais importância à Ciência, a sua popularidade não só não desce, como sobe. Nos dias de hoje, de facto, a Ciência também dá audiências.

Através da Astronomia, no tempo de Galileu, teve lugar o começo do fim do controle da Igreja sobre os pensamentos das pessoas. E embora Giordano Bruno tivesse sido queimado na fogueira, também aqui foi mais uma vez o Universo quem riu por último. Hoje, em Portugal a Astronomia está em risco mas não tenho dúvidas de que mais tarde ou mais cedo, será de novo o Universo quem levará a melhor. E na música da risada poderosa do Universo, dançarão todos os amantes desta bela Ciência que é de todos nós: a Astronomia.


João Lin Yun, Director do OAL

Outubro 2004