PÁGINA 1  |  PÁGINA 2  |  PÁGINA 3  |  PÁGINA 4  |  PÁGINA 5  |  PÁGINA 6  |  PÁGINA 7
 
O SOL E OS SEUS CAPRICHOS

Imagem do Sol obtida pela sonda SOHO, aquando da erupção observada no dia 4 de Novembro. Cortesia de SOHO/EIT (ESA & NASA).

  No fim de Outubro e princípio de Novembro passados, o Sol apresentou uma série de erupções que libertaram grandes quantidades de material para o espaço, produzindo coloridas auroras que enfeitaram os céus nos países do norte da Europa e da América. Entre essas erupções detectou-se a mais energética de sempre.
  Uma observação detalhada da nossa estrela (atenção: nunca se deve observar o Sol directamente, mas apenas com os filtros adequados, sob o risco de se ficar com lesões permanentes na retina) revela-nos uma série de detalhes inesperados: manchas escuras e "frias" nas quais cabem várias "Terras", filamentos e arcos de plasma (gás ionizado), e por vezes enormes protorberâncias de material que é ejectado em direcção ao espaço. Toda esta actividade solar, que se deve à existência de fortes campos magnéticos na nossa estrela, torna-se mais intensa a cada 11 anos. Este fenómeno, denominado por ciclo magnético solar, não é no entanto bem compreendido, e por vezes, quando menos se espera, o Sol causa a surpresa entre os astrofísicos.
  Foi exactamente isto que aconteceu em Outubro passado, numa altura em que o Sol se encontra longe do máximo do seu ciclo magnético (que ocorreu há 3 anos). No dia 28, uma enorme erupção solar foi observada pelo instrumento LASCO, a bordo da sonda espacial SOHO. Este instrumento permite obter imagens do Sol sem ser ofuscado por este, já que permite esconder o disco da nossa estrela com o auxílio de um "disco". A "explosão" observada libertou milhares de milhões de toneladas de plasma para o espaço, a velocidades da ordem dos milhões de km/h! Outras erupções seguiram-se nos dias 29 de Outubro e 4 de Novembro, sendo que esta última terá sido a mais forte até hoje observada. Durante alguns instantes, o Sol emitiu 100 vezes mais raios-X do que faz normalmente.
  Quando o material solar é ejectado na direcção da Terra (o que só aconteceu nas primeiras duas erupções mencionadas), o espectáculo pode ser deslumbrante. A interacção do plasma com o campo magnético do nosso planeta deforma-o, e o vento solar interage com as altas camadas da atmosfera terrestre (sobretudo nos pólos). Esta interacção ioniza os átomos dos diversos elementos químicos presentes na nossa atmosfera, produzindo auroras multicoloridas. Embora estes fenómenos não sejam perigosos para os seres humanos, podem danificar satélites e sistemas eléctricos, e dificultar as comunicações. Infelizmente, só muito raramente as auroras podem ser observadas de Portugal, que se encontra a uma latitude demasiado afastada dos polos. Mas em 1854, uma explosão provavelmente mais forte do que a agora estudada, enviou enormes quantidades de plasma na direcção da Terra, produzindo mesmo incêndios na rede eléctrica e de telégrafo. Nessa altura, as auroras puderam mesmo ser observadas em Roma e no Havai.
  Esta observação vem numa altura em que uma equipa de investigadores parece ter descoberto que o Sol, nos últimos 50 anos, tem estado mais activo do que nunca. Esta descoberta tem enorme importância, já que hoje se sabe que a actividade solar pode influenciar muito o clima na Terra.


Nuno Santos

CAAUL/OAL

 
"CANTO DO CISNE" NO CENTRO DA GALÁXIA

A região central da Galáxia, observada no infravermelho próximo com o instrumento NACO, no telescópio Yepun do VLT. A imagem da esquerda revela a complexidade existente em torno do buraco negro central; a imagem da direita mostra a mesma região 39 minutos depois, com uma explosão que se pensa ser proveniente do "monstro". De notar que, sem um sistema de óptica adaptativa, toda esta região apareceria como um único ponto de luz, devido à turbulência atmosférica.

  Uma equipa internacional de astrónomos, ao estudar o centro da Via-Láctea, testemunhou, pela primeira vez no infravermelho, explosões provenientes desta região. Os sinais, que variam em escalas temporais muito curtas (alguns minutos), deverão ter origem na "queda" de material para o buraco negro gigante que se crê existir no centro da Galáxia, e indicam que este "monstro" roda muito rapidamente.
  O estudo do centro da Via-Láctea tem avançado a um ritmo acelerado nos últimos anos, graças aos avanços na tecnologia de observação no infravermelho, necessário para conseguir ver para além da barreira de poeira abundante nas regiões centrais da Galáxia, e na tecnologia de óptica adaptativa, que permite corrigir a turbulência da atmosfera terrestre e distinguir as estrelas que tão densamente ocupam esta zona.
  Assim, sabe-se hoje que a região mais central da Galáxia é extremamente densa, com uma massa equivalente a 3 milhões de vezes a massa do Sol espalhada numa zona de apenas 10 dias-luz. Mais ainda, observações recentes (ver "O Observatorio", Vol 8, n° 8) mediram o movimento da estrela S2, revelando que esta orbita a fonte de rádio e raios-X SgrA* em cerca de 15 anos. A única interpretação possível é a existência de um buraco negro com cerca de 2,6 milhões de vezes a massa do Sol na localização da fonte SgrA* (a emissão rádio e de raios-X desta fonte terá origem na "queda" de matéria para este buraco negro gigante).
  Agora, observações utilizando o instrumento NACO no telescópio Yepun do VLT revelaram, pela primeira vez, explosões no infravermelho, provenientes exactamente de SgrA*. Previstas pela teoria, estas explosões serão o "último grito" da matéria que desaparece para além do chamado horizonte de acontecimentos, a zona que rodeia o buraco negro e do interior da qual nada, nem mesmo a luz, consegue escapar. A periodicidade curta com que estas explosões foram detectadas (cerca de 17 minutos) implica que o buraco negro central estará em rotação rápida - cerca de metade do máximo "permitido" pela teoria da Relatividade Geral de Einstein.
  Eis pois um vislumbre das condições na vizinhança mais próxima de um buraco negro, revelando o "canto do cisne" da matéria em queda para ele...


José Afonso

CAAUL/OAL