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UM MUNDO A EVAPORAR
Doutor Nuno santos
CAAUL/OAL
Entre os mais de 100 planetas extra-solares até hoje descobertos, um tem merecido particular atenção. Orbitando uma vez em cada 3,5 dias a estrela HD209458, este gigante gasoso (com uma massa semelhante à de Júpiter, o maior planeta do Sistema Solar, mas orbitando a uma distância da sua estrela aproximadamente 100 vezes menor do que a que separa Júpiter do Sol) foi descoberto através do efeito gravitacional que induz na sua estrela. Mas após esta descoberta, uma outra observação colocou este mundo nas luzes da ribalta. Os astrónomos puderam medir a diminuição de brilho da estrela no momento em que este planeta passou em frente ao seu disco. Este fenómeno, que se repete a cada órbita do planeta, é denominada por trânsito planetário, e permitiu não só confirmar a existência do planeta em causa, mas também determinar uma série de parâmetros planetários, tais como o seu diâmetro, densidade e massa. Uma série de observações posteriores permitiu mesmo verificar que na atmosfera deste planeta existem quantidades apreciáveis de sódio.

Agora, uma equipa de astrónomos europeus liderada pelo francês A. Vidal-Madjar fez uma nova e importante descoberta. Utilizando o telescópio espacial Hubble, os investigadores obtiveram espectros da estrela HD209458 em comprimentos de onda do ultra-violeta , na região espectral correspondente à risca de hidrogénio Lyman. A utilidade de observar esta região espectral prende-se com o facto de o hidrogénio presente nas altas camadas da atmosfera planetária poder absorver facilmente a luz em certos comprimentos de onda (i.e. cores) bem específicos, produzindo riscas de absorção no espectro. Ora os resultados não poderiam ser mais interessantes: a análise detalhada das observações permitiu aos astrónomos verificar a quantidade de luz absorvida pelos átomos de hidrogénio durante o trânsito planetário (quando o planeta se encontra em frente à estrela) é muito maior que a esperada. Na realidade, as observações só podem ser explicadas se admitirmos que a atmosfera deste mundo se encontra espalhada por uma grande região: mais de 4 vezes o diâmetro do próprio planeta!

A explicação para este fenómeno parece ser, no entanto, relativamente simples. Dada a proximidade a que se encontra da sua estrela, a atmosfera deste gigante está extremamente quente e "inchada". O hidrogénio (que é o elemento mais leve) evapora, ficando mesmo "fora" da influência gravitacional do planeta. A pressão exercida pela radiação estelar vai então "arrastar" consigo os átomos de hidrogénio, produzindo uma cauda semelhante à observada nos cometas.

Pr este processo os astrónomos puderam estimar que o planeta em causa perde continuamente, pelo menos, 10.000 toneladas de hidrogénio por segundo. Embora os números não sejam ainda conclusivos, esta descoberta parece mostrar que um planeta gigante que se encontre demasiado próximo da sua estrela pode "evaporar" e mesmo eventualmente desaparecer.

Este resultado é compatível com a ausência de detecção de planetas gigantes a orbitar uma estrela inferior a 7 milhões de quilómetros.
Imagem do céu centrada na estrela HD209458. Esta estrela, semelhante ao Sol, encontra-se na constelação do Pegaso, e dista cerca de 150 anos-luz da Terra. Dado que brilha com uma magnitude visual de 7, pode ser observada com o auxilio de uns meros binóculos. No entanto, o seu planeta não pode ser detectado directamente nem com os maiores telescópios do mundo.
Cortesia da ESA, NASA, e Digitized Sky Survey.
 
A LUZ MAIS ANTIGA DO UNIVERSO
Doutor José Afonso
CAAUL/OAL
Acaba de ser obtida como um detalhe nunca antes conseguido, a imagem da luz mais antiga do Universo, a chamada radiação cósmica de fundo. Após 12 meses de observações, o Wilkinson Microwave Anisotropy Probe (WMAP) conseguiu revelar como era o Universo apenas 380.000 anos após o Big Bang, identificando as "sementes" do que mais tarde seriam as estruturas cósmicas (galáxias e aglomerados de galáxias) que conseguimos observar hoje.

Após o Big Bang o Universo demorou algum tempo a arrefecer. Até essa altura, matéria e luz interagiam incessantemente, não existindo fotões que pudessem viajar "livremente". A certa altura, com a expansão, o Universo tornou-se suficientemente frio para permitir que os primeiros átomos se formassem e, consequentemente, que os primeiros fotões "livres" pudessem existir. Estes fotões, que ainda hoje existem, contêm pois a informação sobre a distribuição da matéria aquando da última interacção, numa época muito anterior à formação das primeiras galáxias e estrelas.

Viajando durante toda a idade do Universo, acompanhando a sua expansão e alterando em conformidade o seu comprimento de onda, estes fotões podem ser hoje observados na região das microondas.

Previsto teoricamente por George Gamow em 1948, este fundo de radiação viria a ser detectado por Arno Penzias e Robert Wilson em 1965. No início da década de 90 o satélite COBE viria a medi-lo detalhadamente, revelando uma homogeneidade impressionante: em qualquer direcção do céu se pode observar este fundo de microondas, com minúsculas flutuações em torno de uma temperatura de 2,725 graus acima do zero absoluto. São estas flutuações que transportam a informação sobre a distribuição de matéria no Universo, uns parcos milhares de anos após o Big Bang. São estas flutuações que o WMAP agora mediu (ver imagem), com uma resolução espacial cerca de 30 vezes superior à do COBE.

A análise da novas observações do WMAP permite determinar que a radiação cósmica de fundo, originada na última interacção entre luz e matéria, foi emitida cerca de 380.000 anos após o Big Bang. Os primeiros objectos capazes de ionizar p gás primitivo (e de deixarem uma marca na polarização da radiação cósmica de fundo de microondas) formaram-se 200 milhões de anos após o Big Bang, mais cedo do que anteriormente se pensava. Hoje, o Universo tem aproximadamente 13.7 mil milhões de anos de idade e é constituído por 4% de matéria (aquela que nos forma), 23% de matéria escura (que não sabemos o que é) e por 73% de uma "energia escura", que se assemelha a algo previsto por Albert Einstein (mas inicialmente considerada como um erro por ele próprio). Todos estes ingredientes sugerem que vivemos num Universo "plano", que se expandirá para sempre. No entanto, a natureza da "energia escura" poderá modificar este cenário...
A radiação cósmica de fundo e a sua estrutura: os primeiros fotões do Universo e os seus mistérios revelados pelo satélite WMPA.
Cortesia NASA e equipa científica do WMAP.