O QUE É A ANTIMATÉRIA?
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Poderá vir a ser o combustível do futuro nas viagens espaciais
mas, pelo menos por agora, a antimatéria é algo fugaz, sendo difícil
trabalhar com ela, e apenas se pode medir em átomos e não em quilos.

Em que é que pensamos quando ouvimos a palavra "antimatéria"?
Talvez em algo exótico, algo irreal?

Bem, para um pequeno grupo de investigadores da NASA e de algumas
universidades, a antimatéria pode significar o futuro das viagens
espaciais. Quando se trata de originar forças de impulsão, as
reacções matéria/antimatéria não podem ser batidas. Quando uma
partícula se encontra com a sua antipartícula, aniquilam-se uma à
outra e a totalidade das massas de ambas é convertida em pura energia.

Muitos manuais de física descrevem a matéria como sendo "algo que
ocupa espaço e tem massa". Todo e qualquer objecto que alguma vez
vimos é feito de matéria. Sendo assim, se tudo o que conhecemos é
constituído por matéria, o que é afinal a antimatéria? Vamos fazer uma
curta viagem no tempo, até cerca de 1930, para encontrarmos uma
resposta.

Em 1928, o físico britânico Paul A. M. Dirac (1902-1984) formulou
uma teoria sobre o movimento dos electrões no interior de campos
eléctricos e magnéticos. Teorias semelhantes já tinham sido
apresentadas anteriormente, mas o que tornava única a que foi proposta
por Dirac foi o facto de incluir os efeitos da Teoria da Relatividade
Restrita de Einstein. As equações de Dirac funcionaram especialmente
bem, descrevendo muitos atributos do movimento dos electrões que
outras equações anteriores não conseguiam descrever.

Mas a sua teoria levou também a uma previsão surpreendente: o
electrão tinha de ter uma "antipartícula", com a mesma massa mas de
carga eléctrica positiva (o oposto da carga eléctrica normal,
negativa, de um electrão). Em 1932, Carl Anderson observou
experimentalmente esta nova partícula, que passou a ser conhecida pelo
nome de "positrão". Este foi o primeiro exemplo conhecido de
antimatéria. Em 1955 o antiprotão foi produzido em Berkeley, nos
Estados Unidos, e em 1995 um grupo de cientistas conseguiu criar o
primeiro átomo de antihidrogénio nas instalações do CERN, na Europa,
ao combinarem um antiprotão com um positrão (um átomo normal de
hidrogénio é constituído por um protão e um electrão). Mas quando
estes antiátomos são criados, viajam a velocidades próximas da da luz
e não duram muito tempo (o tempo de vida típico é de 40 nanosegundos,
ou seja, 40 bilionésimos de segundo).

A equação de Dirac previa que todas as partículas fundamentais
existentes na Natureza têm de ter a "antipartícula" correspondente. Em
cada caso, as massas da partícula e da antipartícula são idênticas e
outras propriedades são quase idênticas. Mas, em todos os casos, os
sinais matemáticos de uma das propriedades estão invertidos. Os
antiprotões, por exemplo, têm a mesma massa dos protões mas carga
eléctrica oposta. Desde a época de Dirac têm sido observados diversos
destes pares partícula-antipartícula. Mesmo partículas sem carga
eléctrica, como os neutrões, têm a sua própria antipartícula. Estas
possuem outras propriedades, tais como o momento magnético, por
exemplo, com um sinal invertido.

Curiosamente, não existe diferença real entre as partículas e as
suas antipartículas nas teorias da física de partículas. Elas são
equivalentes. A maioria dos teóricos acredita que, no momento do Big
Bang, partículas e antipartículas foram criadas em números
praticamente iguais. Mas então porque é a antimatéria tão rara, hoje
em dia?

Uma tentativa de resposta a esta questão (e trata-se,
efectivamente, de uma tentativa de resposta já que esta pergunta
corresponde a um tópico que ainda está em investigação) encontra-se na
palavra "quase". A teoria actualmente mais aceite sugere que se o
número das partículas ultrapassasse o das antipartículas em apenas uma
parte por cada 100 milhões, o Universo actual poderia ser explicado
por esse ínfimo número de partículas extra que não foram aniquiladas
através de encontros com as suas antipartículas. Outras teorias
sugerem que, mesmo que matéria e antimatéria tivessem sido criadas em
iguais quantidades durante o Big Bang, a física da matéria e da
antimatéria seria ligeiramente diferente. Esta diferença hipotética
favoreceria a matéria que restaria após toda a antimatéria ter sido
aniquilada.

Então é isto que é a antimatéria. Teremos então a certeza que não
existe mais antimatéria no Universo?

O Dr. Charles Meegan, um astrofísico do Centro de Voo Espacial
Marshall, nos Estados Unidos, assinalou que os observatórios de raios
gama em órbita terrestre mediram o céu num intervalo de energia tal
que teriam necessariamente detectado a assinatura da aniquilação da
antimatéria. "No entanto, até hoje, nenhum dos instrumentos a bordo
desses observatórios revelou qualquer prova da existência de vastas
quantidades de antimatéria no Universo", diz Meegan.

Existem provas de que reacções muito energéticas estão a ocorrer
em pontos isolados, tal como no núcleo de algumas galáxias (consultar,
por exemplo, a página
ftp://ftp.hq.nasa.gov/pub/pao/pressrel/1997/97-083.txt, em inglês) e
quasares, por exemplo, que criam antimatéria, a qual é de seguida
aniquilada. Mas pensa-se que não se trata da antimatéria residual
deixada pelo Big Bang.

Na Terra, toda a antimatéria existente pode ser contada em átomos
individuais. Positrões de baixa energia são rotineiramente utilizados
numa técnica de imagiologia aplicada à medicina e denominada
tomografia por emissão de positrões, bem como no estudo de materiais
importantes utilizados em circuitos electrónicos.

Estes positrões são o resultado do decaimento natural de isótopos
radioactivos. Apesar da sua utilidade em aplicações de investigação
médica e de materiais, estes antielectrões não existem em número
suficiente para se poder criar uma forma útil de combustível de
foguetes a partir deles. As partículas de antimatéria de alta energia
só são produzidas em números relativamente elevados num pequeno número
dos maiores aceleradores de partículas do mundo. A actual produção
mundial de antimatéria é da ordem dos 1 a 10 nanogramas (bilionésimos
de grama) por ano!

Como pode então a antimatéria ajudar-nos na exploração espacial? A
resposta reside na famosa equação de Einstein, E=mc2. Quando a
antimatéria aniquila a matéria normal, toda a massa das duas
partículas é convertida em energia. A energia por partícula resultante
dessa transformação excede largamente a eficiência das reacções
químicas tais como a combustão de oxigénio e hidrogénio actualmente
utilizada nos motores principais do vaivém espacial.


Primeira parte de uma notícia adaptada de:
http://spacescience.com/headlines/y2000/ast29may_1m.htm?list