UMA REVIRAVOLTA NUMA NEBULOSA CONHECIDA
As imagens podem ser enganadoras, principalmente quando tratam de objectos
celestes como galáxias e nebulosas. Estes podem encontrar-se a distâncias
tais, que os astrónomos não podem observar a sua estrutura tridimensional.
Por exemplo, a nebulosa da Hélice, a nebulosa planetária mais próxima da
Terra, objecto de atenção de astrónomos profissionais e amadores,
assemelha-se a um donut colorido quando observado numa imagem em falsa cor
(onde as cores representam intensidade ou brilho). As imagens antigas deste
objecto complexo - o envolvente gasoso ejectado por uma estrela, como o Sol,
no final da sua vida - não permitiram aos astrónomos analisar detalhadamente
a sua estrutura. Uma das hipóteses colocada já há algum tempo é que a
nebulosa tem uma estrutura semelhante a uma bobine, um enrolamento de fio
helicoidal.
Veja uma imagem da nebulosa da Hélice em:
http://www.oal.ul.pt/astronovas/estrelas/helix2.jpg
Esta imagem foi obtida a partir da combinação das observações da Hubble
Advanced Camera for Surveys e da câmara de mosaico do telescópio de 4m em
Cerro Tololo. A Hélice é tão grande que foi necessário a utilização de
ambos os telescópios para se obter uma imagem completa: o Hubble observou a
região central enquanto a o telescópio de Cerro Tololo, com maior campo de
visão, observou a região externa.
Contudo, recentemente, uma equipa de astrónomos conjugou os dados de
diversas observações feitas em diferentes observatórios e concluiu que a
estrutura da Hélice é bastante mais complexa. Os dados sugerem que a Hélice
é composta por dois discos gasosos aproximadamente perpendiculares entre si.
Os astrónomos usaram imagens de grande detalhe da Hubble Advanced Camera for
Surveys, imagens obtidas no Cerro Tololo Inter-American Observatory no Chile
e noutros telescópios terrestres que operam no óptico e no rádio. Estas
imagens revelam o valor da velocidade e direcção do material ejectado pela
estrela. Os astrónomos esperam que este estudo nos proporcione maior
conhecimento da forma como as camadas de gás expelidas por estrelas como o
nosso Sol adquirem as formas complexas das nebulosas planetárias.
As observações agora obtidas mostraram que o anterior modelo da nebulosa da
Hélice era demasiado simplista. Há aproximadamente um ano atrás
acreditava-se que a Hélice tinha a forma de um donut preenchido no meio.
Agora constatamos que a estrutura visível nas antigas imagens é apenas a
estrutura central da nebulosa. Um disco muito maior com a forma de um anel
largo e espalmado rodeia o donut, estando orientado de forma aproximadamente
perpendicular em relação ao mesmo. O disco maior é mais brilhante num dos
lados por estar a embater em material interestelar com o movimento da
nebulosa através do espaço, tal como a proa de um barco provoca turbulência
na água quando o barco se desloca. A colisão comprime o gás, fazendo a
região brilhar. No entanto ainda não foi possível explicar como adquire tal
forma, algo que está relacionado com os últimos estádios de vida da forma
mais comum de estrelas em colapso.
Veja uma ilustração desta complexa estrutura em:
http://www.oal.ul.pt/astronovas/estrelas/helix3.jpg
Para visualizar a geometria da Hélice podemos imaginar uma lente de um par
de óculos inclinada com um determinado ângulo em relação ao aro de suporte.
No caso de uma nebulosa, encontrar uma geometria semelhante seria no mínimo
surpreendente mas foi o que aconteceu.
Outra surpresa foi que a estrela expeliu material para os dois discos em vez
de apenas para um. Cada disco tem pólos Norte-Sul e o material está a ser
ejectado ao longo destes eixos. Nunca antes se tnha imaginado a
possibilidade da nebulosa ter dois eixos de simetria; sempre foi estudada
como tendo apenas um. Este modelo com dois eixos permite-nos perceber o
aspecto complexo da nebulosa.
Usando os dados recolhidos da Hélice, os astrónomos criaram um modelo
tridimensional que representa os dois discos. Estes modelos são importantes
para mostrar a intrincada estrutura da nebulosa.
Não existem certezas relativamente ao modo como os discos foram formados e
porque razão se encontram praticamente perpendiculares um ao outro. Uma
hipótese possível é que a estrela que originou a nebulosa tenha uma estrela
companheira. Observações de raios-X por satélites em órbita proporcionaram
dados que sustentam tal conjectura. Um dos discos pode ser perpendicular ao
eixo de rotação da estrela nossa conhecida enquanto que o outro pode-se
encontrar no plano orbital das duas estrelas.
Os astrónomos também acreditam que os discos se formaram durante duas épocas
diferentes de ejecção de massa pela estrela. O disco interno foi formado
6600 anos atrás e o disco externo aproximadamente 12000 anos atrás. O disco
interno está a expandir-se ligeiramente mais depressa que o disco externo.
Porque expele a estrela material em dois estágios separados por um intervalo
de 6000 anos? Por agora, apenas a própria nebulosa conhece a resposta.
A estrela semelhante ao Sol que esculpiu a Hélice criou um belíssimo objecto
celeste. Criará o Sol uma estrutura tão majestosa quando morrer daqui a 5
mil milhões de anos? Como estrela única criará uma nuvem brilhante de
material expelido mas não terá uma estrutura tão complexa como a Hélice.